A arquitetura de sistemas modernos não é mais construída sobre decisões binárias. Hoje, uma empresa pode — e muitas vezes precisa — rodar cargas em múltiplos provedores (multicloud), adotar um modelo serverless onde faz sentido, e manter observabilidade distribuída para não perder a visão de conjunto. Mas como essas três abordagens se combinam de forma estratégica? Onde estão os pontos de atrito e sinergia?
Neste artigo, vamos explorar o cenário real de quem está lidando com ambientes complexos e quer mais do que buzzwords: quer performance, governança e simplicidade operacional.
Multicloud deixou de ser exceção
A adoção de multicloud vem deixando de ser uma escolha e passando a ser uma consequência. Parte disso se deve a aquisições, parcerias, exigências de compliance ou disponibilidade regional. Outra parte vem de decisões técnicas: certos serviços são melhores em um provedor do que em outro.
Segundo o relatório da Flexera, 92 % das empresas adotaram estratégias multicloud em 2025. E mais: a pesquisa mostra que 85 % das grandes corporações usam múltiplas nuvens. No entanto, há um hiato evidente: apenas 9 % dos profissionais possui experiência consolidada com múltiplos provedores, conforme estudo da Pluralsight.
Na prática, empresas estão rodando workloads em AWS, Google Cloud e Azure — muitas vezes simultaneamente — e se beneficiando de:
- Redução de dependência de um único fornecedor
- Otimização de custos por tipo de serviço
- Maior cobertura geográfica
- Redundância estratégica
Por outro lado, multicloud impõe desafios concretos: provisionamento, segurança, monitoramento e governança se tornam mais complexos. O que antes era resolvido dentro de um único ecossistema agora exige integrações e políticas distribuídas.
A saída? Arquiteturas bem definidas e uso de ferramentas que abstraem ou unificam a gestão entre clouds — como malhas de serviço, control planes externos ou automações baseadas em GitOps.
Serverless como ponto de agilidade
Serverless deixou de ser sinônimo apenas de funções Lambda. Hoje, falamos de bancos serverless, containers serverless, data pipelines event-driven e serviços gerenciados que escalam sob demanda.
O mercado serverless vem apresentando crescimento forte. Dados recentes estimam de US$ 7,7 bilhões em 2020 para US$ 21 bilhões até 2026, com CAGR de 17–17,5 %. No AWS, 70 % dos clientes já utilizam ao menos um serviço serverless, enquanto no Google Cloud o índice é de 60 % e no Azure, 49 % .
A vantagem mais clara é o foco no código e na lógica de negócio. Não é preciso manter infraestrutura, monitorar instâncias ou lidar com capacidade ociosa. Serverless entrega:
- Escalabilidade automática
- Redução de sobrecarga operacional
- Pagamento por uso real
- Time-to-market mais rápido
Mas nem tudo são flores. O modelo serverless traz restrições, desde tempo de execução até limites de cold start e visibilidade. Em ambientes multicloud, essas limitações se amplificam, pois cada provedor implementa serverless à sua maneira.
É nesse cenário que a observabilidade distribuída se torna crítica.
O papel da observabilidade distribuída
Monitorar sistemas distribuídos, com serviços espalhados entre clouds e execução sob demanda, exige um modelo novo de observabilidade. Logs, métricas e traces precisam atravessar ambientes distintos e se conectar a uma linha do tempo coerente.
Ambientes multicloud e serverless geram volumes de dados intensos. Um levantamento da Dynatrace envolvendo 1.300 CIOs revelou que 86 % dos líderes consideram esse volume “além da capacidade humana de gerenciamento”. Nesse contexto, equipes utilizam em média 10 ferramentas diferentes para monitorar sistemas, logs e métricas.
A complexidade, por sinal, é imensa: 88 % afirmam que stacks cresceram em complexidade no último ano e 51 % esperam mais complexidade. E isso impacta nos resultados: 87 % dizem que a experiência do cliente piora, 84 % notam mais dificuldades em segurança .
Observabilidade distribuída não é apenas coletar dados, é conseguir trazer o sentido deles em tempo real. Para isso, é fundamental:
- Correlacionar eventos de múltiplas fontes
- Visualizar chamadas entre serviços
- Detectar anomalias de forma automática
- Garantir rastreabilidade ponta a ponta
Ferramentas como OpenTelemetry, Grafana Tempo, Jaeger, Datadog e New Relic vêm evoluindo para lidar com essa complexidade. Elas permitem que devs e SREs tenham visão de sistema, mesmo quando ele se espalha por dezenas de funções serverless, filas, APIs e bancos em nuvem diferentes.
Casos de uso na prática
Imagine uma arquitetura onde a API pública roda em Cloud Run (Google), o processamento de dados está em Lambda (AWS), o banco é Aurora Serverless e os dados de log são armazenados no Loki (via Grafana).
O desafio não está só em fazer esses componentes se integrarem. Está em identificar gargalos, erros intermitentes ou latências cruzadas.
Com uma boa estratégia de observabilidade, é possível:
- Saber qual parte do sistema está degradando a performance
- Traçar uma requisição do início ao fim, mesmo entre ambientes distintos
- Automatizar alertas baseados em comportamento anômalo, não só em thresholds
- Analisar impacto de uma mudança em tempo real
Estratégias para orquestrar tudo isso
Adotar multicloud, serverless e observabilidade distribuída de forma isolada não garante eficiência. O valor está na integração entre as escolhas.
Algumas práticas funcionam como ponto de equilíbrio:
- Infraestrutura como código (IaC)
Usar ferramentas como Terraform, Pulumi ou Crossplane permite manter controle e reprodutibilidade, mesmo em ambientes híbridos.
- Backplane de observabilidade unificado
Centralizar logs, métricas e traces em um backend comum reduz o atrito para troubleshooting e análise.
- Padronização de eventos e mensagens
Definir contratos claros entre serviços facilita rastreamento e monitoramento, mesmo em execuções assíncronas.
- Adoção de arquitetura orientada a eventos
Com eventos como linguagem comum, sistemas serverless podem interagir de forma mais coesa e auditável.
- Políticas de segurança transversais
O controle de identidade, autorização e criptografia precisa estar presente em todos os pontos, independentemente do provedor.
E quanto ao custo?
Uma preocupação legítima ao combinar multicloud com serverless é o custo. Embora o modelo serverless tenda a reduzir gastos com recursos ociosos, a dispersão entre provedores pode gerar desperdício se não houver governança.
A observabilidade, novamente, é aliada aqui. Com dados em mãos, é possível:
- Identificar funções subutilizadas
- Otimizar cold starts com warming inteligente
- Eliminar redundâncias entre ambientes
- Calcular ROI de workloads por região ou provedor
Mais importante do que controlar o custo é entendê-lo. E isso só acontece com visibilidade, não com adivinhação.
Mais controle, menos complexidade
Multicloud não precisa ser sinônimo de caos. Serverless não significa perda de controle. E observabilidade distribuída não precisa custar uma fortuna. Quando essas três abordagens são combinadas com inteligência e ferramentas certas, elas não só convivem como se fortalecem.
O segredo está em tratar a arquitetura como algo vivo, dinâmico e conectado. Ao invés de empilhar soluções, pense em compor uma estrutura coerente, onde cada decisão contribui para um sistema mais resiliente, escalável e observável.
Na Nexxt Cloud, acreditamos em soluções pensadas para o futuro. E o futuro, mais do que híbrido ou multicloud, é interoperável, autônomo e visível de ponta a ponta.